22 março, 2005

Bela Marília, de outros tempos, de sua infância...

Marília sentiu leve a onda bater em seu pé; mas não foi onda aquilo, disse a criança a seu lado. Era o restinho da onda que veio aqui dizer "olá". E a criança perto de Marília correu por entre os vários "olás" do mar e os saudou rolando na areia e Marília ali, olhando a cena e querendo fazer uma expressão de choro. Queria se emocionar, mas não conseguia. Acabou rindo. Marília precisava de emoção mas não sabia a quem pedir ou onde procurar, e quando conversava sobre isso com alguém, incialmente acreditavam estar ela precisando de aventura. E por que iria ela querer aventura? Queria quietude, que não possuía. Queria amparo, que não conseguia. Queria zê-lo, que pedia e não lhe davam. Tamanha era a negativa para as suas necessidades que acreditou ser uma fase de sua vida, mera carência ou qualquer outra frescura, mas enganava-se. Tudo nela já havia decidido por uma pausa na maneira de vida que tinha, decidira por um outro passo que nem ela própria conseguia realizar consciente e o caminho que seria um bom sinal, abria em delta a sua frente.
Olhando a areia sentia frio, por que aquela imensidão lhe deixava só, e como não gostava de frio, achou que sua época sozinha já bastava. E para quem isso teria importância? Era uma boa pergunta a ser feita por si mesma, pois não via chance de alguém, verdadeiramente, se importar. Queria ser o apoio de alguém, ter esse apoio e sentir-se integrada. Que palavra! Que desejos! Eram de uma criança. Coitada!
Marília, Marília, lhe diziam. Só por que pedia. Lhe avisavam para não se aninhar em vida alguma, mas precisava viver aquilo que sua vida e seu corpo almejavam. Como poderia resistir aquele apelo? Era ela querendo ser outra e manter-se a mesma era uma ofença. Entregou-se a pobre Marília à mendicância. Pedia emoção, pedia afeto, pedia para que o outro pedisse também, mas como mendiga, não lhe dirigiam sequer olhar. E Marília ficou só. E até agora vive só. Mendigar emoção a fez perder o pouco que guardara da infância. Bela época, bela Marília, de sorriso largo e olhar doce que brincava na areia da praia saudando o restinho de onda que vinha dizer "olá".