28 setembro, 2004

Algumas mães são breves

Bastou um piscar de olhos. Um movimento ágil de suas pálpebras para que tudo que havia construído viesse a desmoronar. Enfim, a maternidade estava morta. A idéia dela também. Joana, em míseros segundos, começara a sentir falta da dor do parto, de dar o peito, do choro, de tudo. Seu olhos já negros adotaram o breu, o luto pelo berço, pelas madrugadas, pela paternidade de seu futuro companheiro. Sim, a paternidade lhe emocionava, deveras. A devoção de um pai que nunca teve poderia amansar seu coração e trazer a solidez para sua felicidade. Mas para que pensar nisso? Por que sacrificar ainda mais seu corpo com tanta tristeza? Para que lembrar que seu companheiro não queria filhos e que seu pai existia, e fazia-se perceber com tanta maestria, nas marcas do corpo de sua mãe? Chorava Joana por seu útero, pelo sangue que não vira. O leito do hospital não era o da maternidade e os pontos em seu ventre não eram da cesária. O filho que carregava há pouco? Que filho? Há apenas a marca de qualquer cirurgia, que um dia precisara fazer.